Somos
agora um quarto do que fomos. Entregamo-nos a quartos com corpos novos, com
roupa caída, nunca deixamos a cama vazia, mantemos a cabeça na fantasia para
não enfrentar a realidade vazia onde já não há magia onde um dia tivemos tudo. Embebedo-me
em cigarros apagados, fumados à velocidade de te esquecer. Entregas-te a copos
pagos a miúdas novas que conduzes para o teu corpo. Tocas-lhes como se fossem
eu, mas nunca as beijas da mesma maneira que me olhavas. Tu, meu amor,
anoiteces-me e eu nunca sei a letra da canção com que te pareces. Percorro o
teu corpo como uma estrada. Há semáforos e sinais, e rugas e montanhas, e
cabelos e ondas, e tu és uma paisagem que me cansa os olhos. Tens manchas aqui
e ali daquelas que amaste sem retorno, dos dias em que te magoaste sem consolo,
das feridas que abriste num sufoco. Os teus pulsos já gritaram um dia por
socorro, e tu silenciaste-os com lâminas afiadas, apontadas às tuas próprias
extremidades. As avenidas tuas são tão diferentes das minhas ruas, meu amor. Sou
muito sol e tu és tanta lua. Mas há sempre uma altura do relógio em que nos
cruzamos – só temos um céu de distância. As tuas marcas não me fazem confusão,
não tenho pena – apenas fico num dilema entre a curiosidade e o respeito pelo
espaço que ocupa a tua escuridão. Quantos metros tem a tua tristeza? Por
quantas milhas espalhaste as lágrimas? É assim que nascem oceanos… Onde
nadamos, somos felizes e nos afogamos…
Sem comentários:
Enviar um comentário