Em dias de chuva és a gota que não sai da janela. Quase que
te oiço a passar por mim. É suave a tua ausência, e só se deixa vislumbrar
quando estou só. De resto, o mundo passa-se vulgar. Os dias saltam de uns para
os outros e nem oiço o tempo correr. Não vou atrás dele, por isso não vejo quão
longe está, quanto se afastou de mim. Se fosses uma palavra, seria ‘nostalgia’.
A sensação de que tudo se reformou, instalou-se no meu corpo
e entranha-se nos meus lençóis à noite. Hastes presas nas minhas saudades, que
não as deixam sair. Junto-as uma a uma, dentro de mim. Há mais lá fora, eu sei.
Mas quem está lá a segurar a porta? O semáforo está sempre vermelho e não tenho
direito a passagem. Quase que te vejo. Às vezes chego a pedir. Para te ver, mas
não agora. Não enquanto tiver medo. Não enquanto não estiver preparada. De dia,
que a noite amplia-nos os pavores, e os meus já são arranha-céus. Estou calma –
sou serena. Só em raros momentos deixo que o medo tome conta de mim, deixo que
pegue no meu corpo e o trema, deixo que segure no meu coração e o acelere,
deixo que contagie a minha sanidade e a faça tombar. Deixo… E depois passa. Volto
ao mundo com a cara lavada e o embaraço de ter deixado a vulnerabilidade
chegar. Mas que posso fazer? São fases. Mantemo-nos de pé, só haveria outro
resultado: efeito dominó, caídos um a um à porta da tua ausência.
Ir é uma palavra curiosa, principalmente quando não temos perceção
do seu verdadeiro significado: Ir, quando acarreta o não voltar. Surgem-me
questões ao deitar: Há mais alguém, ou está sozinha? Está tudo bem, há vida
vizinha? Onde está? O que há depois? Talvez acalme um dia. Talvez não. As
indecisões não me chateiam, mas gostava que me deixassem dormir.
Ninguém nota que mudei, pois sou a mesma cara, o mesmo
sorriso, o mesmo corpo. Pelo menos, por fora. Ninguém vê o que esconde a
carapaça, o que se guarda no interior. Às vezes é solidão, outras chega a saber
a dor. Resta-me aguçar o paladar… E conseguir dizer: Tenho saudades tuas. E nem
sequer faz mal - só me faz a mim.
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