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11 de fevereiro de 2017

Para Ti

Desde que me escreveste que o percurso foi agitado. Física, mental e espiritualmente. Um carrossel cuja paisagem envolvente muda a toda a hora.

Sempre que acho que mudei (para melhor) faço algo que me relembra que ainda sou a mesma miúda perdida do ano passado. Não que isso seja com ações significativas, nem tão pouco semelhantes àquelas que foram do conhecimento geral. Não… nada de exposto, nada de físico sequer. Tão pouco de preocupante. É apenas um clicar na minha mente que me lembra que (ainda) não estou bem. Se calhar nunca vou estar – e se calhar isso é o certo. Se calhar a minha essência é esta: à deriva… às vezes à tona, às vezes no fundo. Com ondas de felicidade e com vagas de melancolia, com nuances de uma desmotivação e desinteresse que me fazem perguntar quem sou, onde está a Inês de antes, que fascinava as pessoas e as fazia ver em mim um potencial que agora não reconheço. Às vezes acho que a minha força ficou no chão daquele quintal. Mas depois lembro-me que eu saí de lá. Estou de pé – pelos outros, e mais recentemente, por mim. Tropeço às vezes, mas nunca sei se chego ou não a tombar.

A Alice… ela será sempre parte de mim. Havia uma Inês antes de haver Alice, mas não sei se haverá alguma vez outra vez apenas a Inês. Eu acho que não. Às vezes a Alice abraça-me com tanta força que me soa a sufoco, outras vezes, coabitamos pacificamente no mesmo corpo.

E tens razão quando dizes que o meu problema sempre foi de sensibilidade… aliás, é mais que isso, é uma fome inesgotável de experiência, uma luta pela liberdade que acho que nunca chego a ganhar. As dúvidas são idênticas, a vontade de fugir é tanta quanto antes. A necessidade de escape não fugiu. Apenas encontrei outras formas de me ausentar – mais saudáveis, menos perigosas. Escrever é uma delas. Manter-me ocupada. Fazer o máximo que consigo pelos outros. E não é máscara, não sou eu a fugir aos problemas. É terapia. É cura.

Continuo sem encontrar sentido para este mundo, para esta humanidade, para estas pessoas, e para esta Alma em que me metamorfoseio. A única resposta que encontro é que o problema não está na abordagem, mas na origem: nos pensamentos, os que pesam, os que não me deixam dormir, os que não me deixam estudar, os que não me deixam sossegar. Por algum motivo o Livro do Desassossego está sempre na minha mesa de cabeceira. Por algum motivo me sinto mais próxima da minha pessoa quando leio Pessoa. Sinceramente, acho que a resposta nunca chegará. A parte boa é que isso me mantém à procura. Talvez não seja tão errado assim.

Continuo a viver num mundo que me soa tão estranho quanto a ti. Não sei bem se vivo mais na fantasia ou na realidade, nem o que será menos doloroso. No entanto, isto não é uma carta triste. A felicidade é sobrevalorizada, de qualquer maneira, na minha ótica. É um sentimento como outro qualquer. Felicidade, tristeza, saudade, melancolia, entusiasmo, excitação… é tudo instantâneo, de curto prazo e todos estes aspectos devem ser vividos. Não quero estar feliz sempre. Mas vou sempre ter a personalidade contente vigiada por uma alma triste.

Há coisas que doem e vão doer sempre mas eu encontro beleza na tristeza. Danos colaterais. Por algum motivo continuo inconscientemente a rodear-me de pessoas que acho que posso salvar. Exausto da vida? Mesmo o meu tipo. A ansiedade acompanha-te à noite? Vamos ser amigos. Será que se os salvar a eles, liberto-me a mim? Ou acabo por sugar os problemas dos outros para o meu próprio núcleo, e com eles, a minha energia toda?

“A satisfação provém da luta.” Prometo continuar a lutar. E apesar de ir ao chão tantas vezes, vou manter o escudo baixo. Só assim se reconhecem amigos no lado que julgávamos inimigo. Vou manter o escudo baixo porque o que nos é desconhecido não tem de ser sinónimo de nocivo. Manter o espírito aberto ao que vier.

“O que se passou está bem…” nos dias em que lhe reconheço ensinamento. Crescimento. O que se passou está mal nos dias em que só vejo o dano que causei.
“O que eu sou está bem…” nos dias em que me aceito e reconheço. O que sou está mal quando deixo que a Alice tome posse integral e me tolde o discernimento.
“Ela está bem…” Ferida… pela vida… por mim, mas bem. Eu tento. Pagarei para sempre a dívida dos meus crimes, mas é uma fatura que me voluntario a restituir. Ela merece.

Há frio e quente. Há prazer e dor. Há certo e errado, mas as linhas são ténues. “Não sou bem nem mal, sempre fui só plural”. Somos o que somos, não somos o que fomos. Somos o que ainda não somos. Somos o quanto isso dói e somos o quanto isso nos faz feliz. Podemos não ser aquilo que ainda não somos, mas somos sempre mais aquilo que aspiramos a ser.

Sabes, há coisas más que acontecem e passam. Há outras que magoam todos os dias. Acho que aquele compasso de tempo se insere na segunda categoria. Ainda estou a aprender a lidar com isso, a toda a hora. Aliás, senão não estaria a escrever-te isto agora. O meu passado invade-me o presente e se por um lado, lamento, por outro, agradeço.

Às vezes sinto que as minhas escolhas me batem mais à porta do que as opções dos outros lhes batem às suas campainhas. Eu às vezes queria um dia sozinha em casa, sabes? 
Os meus erros relembram-me que existem cada vez que olho para as minhas cicatrizes. 
Os meus erros relembram-me que existem cada vez que não aguento mais de uma hora a andar. 
Os meus erros relembram-me que existem cada vez que não posso arranjar um emprego normal numa loja de roupa comum. 
Os meus erros relembram-me que existem cada vez que quero correr e não posso. 
E, nos dias maus, eu só queria ser uma pessoa normal – o que quer que seja que isso signifique. Só queria poder fazer o que toda a gente faz. Só queria pousar a cabeça na almofada à noite e não ter aquele dia de setembro a passar-me em revista à frente dos olhos, como uma história de embalar. Só queria dormir e não sonhar que estou a cair eternamente como a Alice no buraco. Só queria não escrever sobre isto a toda a hora, queria não falar disto a toda a hora mas nos dias maus eu não sei calar(-me).

Mas ao mesmo tempo… há sempre alguém a ouvir. Mas ao mesmo tempo… 
Os meus erros relembram-me que resisti. Os meus erros relembram-me que tive uma família que nunca saiu da minha cabeceira. 
Os meus erros relembram-me que tive amigos que viram tudo e não foram embora. 
Os meus erros relembram-me que conheci pessoas novas que, apesar de saberem a narrativa, não aceitam que ela seja de alguém como eu. Não é essa a Inês que eles veem. 
E nos dias bons eu não quero ser uma pessoa normal. Os meus erros relembram-me que podes começar de novo. Nos dias bons eu quero ser esta pessoa, esta Alma dorida neste corpo vencido, que se regenera na hora a seguir. E por mais que mudar de morada não deixe a casa que levo às costas lá atrás, deu-me um recomeço.

A Alice, não é nem o que eu gostava de ser, nem é o que eu sou. Ela continua a ser parte intrínseca de mim, quer eu queira, quer não. Mas não é o meu eu na totalidade, nem eu seria eu sem ela. Só assim sou fiel a mim mesma. Só assim sou real.

E portanto, quanto ao passado… há dias em que vivo nele. Mas noutros, nos em que ele apenas vive em mim, ele relembra-me que não devo tentar passar-lhe uma borracha por cima, mas sim escrevê-lo a caneta. Pois isto é só uma história e não A Minha História. Essa, ainda está a ser escrita. E um dia vou lê-la, e aperceber-me que já nem me lembrava dela…

E sim, a vida tem uma força infinita… Mas nós também…

Inês (& Alice)





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